terça-feira, 1 de setembro de 2015

CAUSOS : HISTÓRIAS DA TIA FLORINDA




BARNABÉ E O FÍGADO CAPITULO 01
As tradições e a superstição sempre fizeram parte da vida das pessoas. Algumas coisas tolas assim como nunca passar por baixo de escadas porque dá azar .
Ou comer um punhado de lentilhas ou três caroços de romãs pra ajudar a dar sorte no primeiro dia do ano novo e depois guardar na carteira .
Não deixar o sapato nem chinelo virado, que também dá azar...
A verdade é que, superstição é igual opinião : __ Cada um tem a sua.
Mas sempre vai existir também a figura do incrédulo !
Aquele cético que não acredita mesmo em nada sem um bom motivo.
E duvida é de tudo que é ditado popular, crendice, ou tradição que existe .
Lembrando o famoso SÃO TOMÉ . O apóstolo de JESUS , que tendo diante de si o mestre ressuscitado. Ainda duvidava do que os seus próprios olhos viam...
Num tempo em que quase todo o BRASIL, e principalmente o ESTADO DE MATO GROSSO. Eram mesmo mais mato do que cidade.
O BARNABÉ de SOUZA, é que era um desses descrentes.
Era alegre e de bem com a vida, mas... Um verdadeiro cético !
Diziam que manga com leite faz mal . E o BARNABÉ quis experimentar só pra ver o que aconteceria. E nada aconteceu felizmente !
__ " Em porco, o que faz mal mesmo é a faca" _ disseram os seus amigos zombando dele.
Falavam que não presta assobiar de noite . Mas o BARNABÉ vivia fazendo isso. Tanto na noite como durante o dia. Juntava as duas mãos e soprava aquilo tirando um som estridente e oco o tempo todo.

Até que pegou uma grande prática nessa arte. Parecia um flautista.
Apesar que tocava melhor mesmo era a sua viola...
Alguns lugares tinham a fama de ser mal assombrados . E isso também o BARNABÉ nunca levou a sério.
Achava que tudo não passava é de exageros do povo. Tudo Besteiras !
De Gente que vivia com medo de coisas de outro mundo atoua .
Todo mundo sabe que não presta dormir de chapéu !
BARNABÉ também sabia . Mas nunca se importou com isso !
Às vezes não tirava nem as esporas antes de ir dormir.
Que dirá as botas e o chapéu .
Num certo dia ele vinha a cavalo pra sua casa . Passou pelo sítio do seu amigo . Compadre Anésio .
E Dona Marília e Seu Anésio estavam ali sentados na varanda, e o chamaram , quando viram passar na estrada .
__Vamos chegar compadre BARNABÈ ! Como que vai o sinhor ?
Tudo em paz ?
__ Ô Seu Anésio. Boa tarde Dona Marília. Como é que vão vocês ?
_ Tudo bem compadre Barnabé. E o sinhor, ta vindo de onde essa hora ? __ Tive que ir visitar minha tia Joana, que está meio adoentada...
_ Ai coitada ! E como é que ela está ? È alguma coisa grave ?
__ Acho que não. Ela já ta mesmo velhinha e qualquer coisinha ela já fica achando que já ta pra morrer. Mas não é nada sério não.
_ O sinhor já almoçou compadre ? Não quer tomar um cafezinho ? Ou então um bom dum tereré ?
__ Não, não . Saí de lá sem comer nada. Se tiver aí um cafezinho...
_ O sinhor não quer almoçar então ? Já é mais de uma hora e a fazenda é longe... Tem arroz, feijão. Milho verde bem cozido, quiabo...

__ Brigado compadre Anésio. Aceito sim . Já to anté tinindo da fome a essa hora ! Mas o sinhor num tem aí uma carne com mandioca ?
_ Olha compadre, carne não tem. Tem ensopado de peixe. O senhor sabe que na semana santa a gente aqui não come carne...
__ Que bobagem compadre ! Eu não dispenso uma carninha num almoço nem na sexta feira santa ! O vigário que mi adisculpe !
_ Bom, ontem os peão mataram dois veado mateiro e nois não comemos tudo. Deve ter aí um pouco da carne, eles iam salgar pra fazer o charque e um pedaço de fígado...
_ Se o sinhor quiser eu posso preparar ...
__ Claro ! Se não for incomodar a sinhora Dona Marília ...
_ Que nada compadre Barnabé . É Com muito gosto ...
__ Já faz um tempão que eu não como carne de caça.
Dona Ramona e Dona Marília prepararam um banquete pra servir ao compadre Barnabé .
Mas a cozinheira ficou escandalizada com o fato de o Barnabé querer comer carne logo na semana santa.
__ Patroa, será que o seu Barnabé não sabe que na semana santa a gente não pode comer carne ? A sinhora devia falar pra ele não fazer uma coisa dessa . È até um sacrilégio . _ e danou a fazer o sinal da cruz várias e várias vezes .
__ O Barnabé é mais teimoso do que uma tropa de mulas Ramona . E nem adianta falar nada .
Até parece que você não conhece aquele galhofeiro !
_ Qualquer dia desses Deus castiga o seu Barnabé por ele ser tão relaxado desse jeito ! Aí ele vai ver o que é bom ...

__ Acho que Deus tem mais o que fazer do que se preocupar com quem não acredita em nada como o Barnabé , Ramona .
_ Quando acontecer alguma coisa, ele que não diga que ninguém avisou .
E o Barnabé si fartou de comer .
Porque estava com tanta fome por ter passado demais da hora de almoçar, que sentia ter era um buraco no lugar do estômago .
E comeu toda aquela carne ... Ou melhor, o fígado .
E sem um pingo de peso na consciência :
__ Mas quê que semana santa que nada ! _ pensava ele zombeteiro.
__ De estômago cheio a vida fica muito mais feliz ...
Barnabé ficou um pouco mais com seu Anésio e a Dona Marília , só pra não fazer à moda do que faz o cachorro vira-lata .
Que acaba de comer e sai correndo ...
Mas ele já tinha mesmo que ir pra casa .
Todo o mundo sabe que um tempo depois do almoço vai ti dando uma moleza. Meio que uma preguiça inrresistível .
Por isso é que se tinha o costume de dormir um pouco após o almoço. Sestiar , era como se chamava esse cochilo.
Diziam ' eu vou sestiar' , ' ele foi sestiar ' , " ela foi sestiar um pouco " ou " agora nós vamos sestiar " ...
E a sésta , ou siesta como alguns dizem. Era um dos poucos costumes que o Barnabé ainda respeitava , embora não fosse lá muito freqüente .
Nesse dia ele estava mesmo cansado .
E vinha pensando se não era mesmo bem melhor , ter ficado um pouco mais lá na casa do Compadre Anésio .
Esticado em alguma rede bem confortável.

Agora com aquele sol pelando nas costas. E já vinha se chacoalhando nos lombo do cavalo o dia inteiro ...
Viu uma figueira enorme na beira da estrada , perto de um mato alto . Havia pegadas recentes de vaca . Tinha passado uma boiada há pouco tempo por ali . Mas tudo estava tranqüilo e silencioso à sua volta ...
Acontece uma coisa muito curiosa com as figueiras . Muita gente diz , e acredita firmemente que são dadas a atrair assombração .
E ser um abrigo dos fantasmas e almas penadas de todos os tipos .
Claro ! Aquela figueira centenária dicerto também já tinha HISTÒRIAS pra contar ...
Mas é claro que o Barnabé não ia se importar nem mesmo se tivesse se lembrado disso ...
Pra não parar embaixo da grande figueira ...
Descrente como ele era de tudo que é superstição !
Chegou , forrou um cobertor , amarrou o cavalo e deitou numa raiz grossa . Dormiu em seguida tranqüilo e sossegado .
Mas depois de um tempo , acabou acordando de chofre , todo assustado .
O cavalo estava inquieto , muito inquieto , e relinchou .
Meio querendo correr . Com medo !
__ É onça ! _ ele pensou . Homem do campo que era . Caçador.
Acostumado a todo tipo de surpresas e perigos . Pegou a sua garrucha e ficou alerta . Olhando ao redor . Vigiando .
Nisso o cavalo se soltou e saiu disparado a galope.
Barnabé olhava à sua volta tentando ver a pintada que ele acreditava estar rondando por alí... Mas não via nada .

Logo ouviu ao longe uma voz horrível que berrava meio que num lastimoso gemido :
__ Ai ! Ai Ai Ai Ai Ai MEU FíGADO !
Ai ! Ai Ai Ai Ai Ai , MEU FíGADO !
Barnabé sentiu um arrepio percorrer-lhe o corpo todo .
Era um homem valente . Mas agora tremia de medo como se já fosse morrer . Tava quase se borrando todo ...
Porque aquela voz estava vindo em sua direção gritando :
__ Ai ! Ai Ai Ai Ai Ai MEU FíGADO !
Ai ! Ai Ai Ai Ai Ai MEU FíGADO ! _ gemeu ela de novo .
E Barnabé tentando se dominar , pensou em sair correndo dali imediatamente. Mas viu que as pernas não lhe obedeciam .
Só tremiam o tempo todo . Mas nada de querer sair do lugar . Enquanto a voz horripilante vinha se aproximando :
__ Ai ! Ai Ai Ai Ai Ai MEU FÍGADO !
Ai ! Ai Ai Ai Ai Ai MEU FíGADO ! !
_ E de repente sai uma voz vinda da sua própria barriga , e responde :
__ FíGADO ! FíGADO ! FíGADO !
E agora , quando a voz falava Ai ! Ai Ai Ai Ai Ai MEU FíGADO !
Dentro da barriga , a outra voz toda alvoroçada dizia :
__ FíGADO ! FíGADO ! FíGADO !
Parecia que milhares de sapos cururus saltavam alí dentro .
E coaxavam em resposta à aproximação da voz maligna saída do capinzal alto . E cada hora a voz vinha de uma direção diferente ...
Pareceu vir detrás dele . E do alto da árvore . Do meio do mato .
E só dizia a toda hora :
__ Ai ! Ai Ai Ai Ai Ai MEU FíGADO ! !

E a barriga : __ FíGADO ! FíGADO ! FíGADO !
Finalmente o bicho que vinha , saiu do meio do mato .
Era uma assombração . Ou sei lá o que ! Um monstro tão feio que mal se podia olhar pra ele .
Era marrom escuro , e tinha um focinho de lobo guará . Com enormes e afiados dentes . Que ficavam quase todos à mostra .
Mesmo que a boca estivesse fechada .
E os olhos esbugalhados eram enormes .
Andava sobre duas pernas peludas que lembravam ao tamanduá bandeira.
As patas eram grandes e arredondadas com garras longas e curvadas .
No alto da cabeça grande e redonda de macaco , Havia uma galhada de cervo e enormes orelhas que eram decaídas , parecidas as de um boi .
E o Barnabé sentia dores terríveis no estômago toda vez que saía de seu bucho aquele estranho coaxado :
__ FíGADO ! FíGADO ! FíGADO !
_ em resposta aos gemidos do monstro horroroso .
Vendo que o bicho vinha em sua direção ele até quis correr .
Mas a dor que ele sentia era tão forte que ele desmaiou ainda antes de poder sair da sombra da grande figueira ...
O Barnabé acordou ainda em tempo de ver quando aquele monstro ia indo embora.
E ia balangando um enorme rabo listrado de marrom e branco .
Que fazia lembrar os quati mundéu ...
A dor da barriga tinha parado . Mas sua camisa agora estava cortada na barriga , pela metade . E uma cicatriz enorme fazia coçar a pele como se ele tivesse se esfregado no capim . Ou jogado pó de mico ali por cima.
Ele se levantou e viu que agora já podia andar .

Só que se coçava que nem um louco.
Foi em busca do cavalo e saiu seguindo as suas pegadas . Mas só o encontrou muito longe .
Dois quilômetros de distância mais adiante, pastando .
E ele se assustou e quis fugir . Mas Barnabé o pegou pela corda e o dominou com facilidade .
Quando chegou em casa ele sentiu foi é vergonha de contar o que lhe tinha acontecido .
E ninguém ia acreditar nele mesmo ... Ou iria ?
Não que alguma vez em sua vida , ele tivesse andado com mintiras .

Mas se nem ele acreditava direito em tudo aquilo por que tinha passado .

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