terça-feira, 1 de setembro de 2015

CAUSOS : HISTÓRIAS DA TIA FLORINDA.

O LAGARTO MUNDERÊ 

A vida das pessoas antigamente se seguia num ritmo quase igual ao dos dias de hoje .
Uma moça casada já fazia algum tempo, cuidava muito diligentemente de seus afazeres na lida doméstica da vida no campo . Cumprindo a sua rotina .
Ainda bem antes de raiar o dia , como sempre se fazia naquela casa , ela já cuidava de acender um velho fogão à lenha. Para assar um delicioso bolo e uns pãezinhos para o seu desjejum, no café da manhã .
A jovem senhora , que na falta de um nome melhor podemos
chamá-la de MARTA.
Era muito trabalhadeira e esforçada. Totalmente dedicada ao lar e à sua família.
Que por enquanto consistia apenas de um filhinho e o marido.
Era ele um jovem trabalhador , e corajoso como ele só . E se chamava PEDRO DE OLIVEIRA. Viviam em perfeita harmonia naquela casa, que dava até gosto de se ver. Seu filhinho de quase um ano chamava-se FABIO. E sua idade era a da época em que as crianças são mais gorduchinhas e interessantes. E quase que ainda não dão muito trabalho aos pais.
Enquanto MARTA cuidava do fogão, conversava com o seu filho para distrair-se.
Ficava ele ainda a maior parte do tempo, dentro de seu bercinho de madeira, brincando com os seus brinquedinhos feitos pelo pai.
O berço tinha sido solidamente construído com boa madeira de cedro por PEDRO. Que era um verdadeiro artista nessas coisas.
Os brinquedos eram, um pião. Ainda que sem o prego na ponta, para que o menino não se machucasse com ele. Um carrinho com parelha de bois.
E uma grande variedade de bichinhos de madeira.
Tinha vaquinhas, porquinhos, cavalos, cachorrinhos, peixinhos gatos e galinhas.
Pedro trabalhava como lenhador, de carpinteiro e peão em comitivas, Para ganhar algum dinheiro. Claro que não era rico,
mas ganhava o suficiente para manter a sua família bem sortida
em suas necessidades mais básicas.
Morando no ranchinho onde viviam. A mais de dois quilômetros de seus vizinhos mais próximos, em qualquer direção que se quisesse seguir...
Marta sempre empurrava o bercinho pra todos os lugares onde ela ia, mesmo que fosse ao curral, para ordenhar as cinco vaquinhas que eles tinham. Ela carregava consigo o garoto.
Essa facilidade ela pedira ao marido, ao pensar na conveniência de ficar de olho no bebê o tempo todo, ainda que estivesse fazendo outras coisas ao mesmo tempo.
Para o marido não fora difícil por algumas rodinhas muito bem feitas, no bercinho do filho. O que lhe dava total liberdade de movimentos...
Difícil mesmo para ele, era passar mais tempo em casa com a sua família.
Já que os trabalhos que ele arranjava pra fazer, quase sempre o obrigavam a passar o dia. E frequentemente até mesmo as noites fora de casa.
Para ele e a família isso era a pior parte na vida que levavam.
Como já foi dito antes, quase tudo antigamente levava muito tempo...
E caso PEDRO pegasse uma fazenda pra desmatar por exemplo. Tinha que trabalhar o dia inteiro cortando as árvores ou arrancando os tocos.
Como é que ele faria pra andar trinta, quarenta ou setenta quilômetros. Para vir comer ou dormir em casa logo ao cair da
noite. E no dia seguinte, já muito cedo.
Estar novamente em forma, e pronto pra trabalhar?
A mesma coisa acontecia quando era preciso viajar pastoreando uma boiada durante vários dias, junto com alguns outros vaqueiros. Até entregar a toda a boiada no seu novo destino. Que podia ser um abatedouro, ou alguma fazenda que podia ficar em outro estado ou até em outro país...
Se o trabalho fosse a construção de uma casa, um galpão ou outra coisa. E o lugar ficasse muito longe de onde Pedro morava.
Da mesma forma ele se veria forçado a passar a noite fora de casa também...
Por isso mesmo era que MARTA já estava até habituada a passar várias noites sozinha em casa, apenas com o bebê como companhia.
Nessa noite em particular, MARTA havia dormido sozinha de novo. Só que o serviço que tinha segurado o seu marido fora de casa, não era muito grande e provavelmente até ao meio dia, ele já estaria regressando.
Apenas a instalação de um cata vento não iria demorar tanto assim. _ pensou ela.
Já com o fogo aceso, MARTA saíra até lá fora para trazer um pouco mais de lenha, e voltara a fazer a massa de seus pães.
E quando ouviu do lado de fora, um barulhão bem estridente.
Pensou imediatamente que o seu velho balde de latão havia caído alí por perto.
Ela largou a massa de pão que tinha nas mãos, e já ia caminhar porta a fora, saindo da cozinha para ver o que havia causado
todo aquele estardalhaço.
Mas um outro estranho som lhe chamou a atenção.
Parecia que do lado de fora alguma coisa se raspava no chão. Se aproximando da casa.
Ela mal tinha dado três passos e parou, completamente estarrecida pela visão horrenda da criatura estranha que, ia entrando porta a dentro em sua cozinha como se estivesse em sua própria casa! Era um lagarto de quase dois metros de altura, a caminhar sobra as duas pernas trazeiras muito grossas e meio curtas.
Com o pescoço largo todo esticado para a frente.
Vinha farejando o ar com um focinho comprido, enquanto tirava pra fora da boca, meio metro de uma língua bifurcada na ponta e vermelha como sangue.
Ao avistar a mulher dentro da cozinha, mostrou quase todos os dentes enormes da bocarra fedorenta. Cantarolando para ela de uma forma totalmente inesperada, um estranhíssimo cumprimento com aquela sua voz tenebrosa:
__ BOA NOITE, BOA NOITE! AI MUNDERÊ, AI MUNDERÊ !
Saindo do seu espanto, e dominando-se a muito custo. MARTA resolveu que era melhor entrar no jogo do monstrengo. Pelo menos até saber exatamente o que deveria fazer. E cantarolou de volta pra ele com a voz insegura :
__ Boa noite pra você também . Ai munderê, Ai munderê
Como se não esperasse mesmo outra coisa da mulher, ele nem ligou a mínima para a resposta dada ao seu cumprimento, e acabou de entrar cozinha a dentro. E depois de dar mais duas
fungadas vigorosas no ar da sua cozinha.
O estranho lagartão voltou a falar novamente.
Cantarolando com a sua voz horrorosa para ela :
__ SINTO O CHEIRO DE CRIANÇA ! AI MUNDERÊ , AI MUNDERÊ!
Sem saber o que pensar. E tendo a absoluta certeza de que o lagarto poderia muito bem encontrar sem a sua ajuda, o bebezinho que ainda dormia dentro de seu berço, na maior tranqüilidade. Ela cantou de volta pra ele :
__ É o meu filho alí no berço. Ai munderê, Ai munderê.
Olhando para o menino dentro do berço, o lagarto cantou de novo para ela com a voz ainda mais horrível, parecendo mais rascante e mais chiada : __ E DE QUEM É ESSA CRIANÇA ? AI MUNDERÊ, AI MUNDERÊ.
Ao que MARTA já muito aflita, respondeu prontamente, cantando também :
__ É do meu marido PEDRO ! Ai Munderê , Ai Munderê!
__ E ONDE É QUE ELE ESTÁ ? AI MUNDERÊ, AI MUNDERÊ ! _cantou desconfiado o lagartão olhando em volta... Via-se logo que ele tinha péssimas intenções. E o que ele fez em seguida deixou isso muito claro.
Andou com passinhos curtos, um pouco mais na direção do berço onde focava o menino. Fabio dormia como um ajinho.
__ Ele está fora trabalhando. Ai Munderê, Ai Munderê. _ disse MARTA, enquanto disfarçadamente passava a mão no cabo de uma pesada panela de ferro. Pronta para tentar defender o filho das garras daquele lagartão.
Como se só estivesse esperando aquela resposta de MARTA,
para mostrar o que realmente tinha vindo fazer naquela casa. O lagarto foi caminhando com passos firmes na direção do berço e do menino. Enquanto cantava, com a cara mais cínica deste mundo, para a mulher que o olhava : __ ENTÃO JÁ VOU COMER ELE ! AI MUNDERÊ, AI MUNDERÊ ! _ revelando toda a maldade de suas reais intenções!
Mas a sorte parecia estar do lado de marta nesse dia, pelo jeito.
Pois o monstro mal-e-mal tocou no bercinho para tentar pegar o menino lá de dentro. O galo cantou lá fora, no terreiro. E o bicho parou no ato!
Deu um passo para trás, olhou cobiçosamente o bebê. E depois virou-se para a mãe. Ainda assustada , com a grande panela nas mãos. E cantou com uma certa decepção vibrando claramente em sua voz horripilante de monstro : __ AMANHÃ VENHO MAIS CEDO! AI MUNDERÊ AI MUNDERÊ !

_ e depois de dizer isso, o lagartão foi saindo na direção da porta aberta. Com o enorme e grosseiro rabo, coberto de escamas brilhantes. A balançar de um lado para outro...







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