Foi bom lembrar dessa época quando meu tio teve
essa chácara lá pelos confins do bairro Los
Angeles!
essa chácara lá pelos confins do bairro Los
Angeles!
Era um lugar muito interessante e a gente
plantava de tudo ali. Cana, abóbora, melancia, ingá de metro e também abacaxi.
E numa tarde de Sol tinindo de quente.
Eu estava plantando em redor da cerca de arame
farpado os pés de abacaxi.
Do outro lado da rua na chácara em frente,
morava a família que era do caseiro de um professor que era amigo do meu tio.
Essa família as vezes recebia a visita de vizinhos e
pessoas que moravam ao redor.
E nessa tarde em que eu tava com uma preguiça do
carvalho, calhou desse caseiro ter vindo até o
portão da chácara vizinha me chamar.
__ Ei moço ! Ei moço ! O senhor podia vir aqui
um pouquinho ?
Eu sempre tive o habito de me fazer de surdo e de
bobo quando me convém !
Tentei fingir que nem tava escutando me chamar,
era longe mesmo né.
Mas parece que quando a gente num procura
encrenca é a encrenca que nos procura !
O velho e o filho aborrecente dele me gritaram
até eu ter certeza de que era comigo mesmo...
Com uma pachorra de dar até dó, eu larguei meu
abacaxi e fui até lá ver o que é que eles queriam.
Andava com indolência e evidente má vontade e
aquele povo me apressando:
__ Rápido moço ! Depressa !
Eu que não ia me apressar só porque aqueles
importunos queriam me chamar !
Finalmente fui até lá pensando que era para
segurar ou mover alguma coisa muito pesada.
Quando se é um negão do meu tamanho a gente se
acostuma a carregar esse país nas costas.
O povo parece que pensa que a obrigação dos bugrão que nem eu é carregar nas costas todos os pesos desse mundo !
Se é pra carregar um fogão chama o moreno ali!
Para arrastar uma geladeira, chama ali aquele
mulato !
Para carregar aquele sofá chamem aquele grandão.
Para empurrar um caminhão que precisa pegar nos
tranco.
Vem aqui fazendo o favor !
Agora você veja, para fazer força todo
mundo te
chama.
chama.
Mas se entregam uma pizza, ninguém fala vamos
convidar o bugão ali !
Se tem um churrasco, ou se fazem um bolo ou
quando comem um sorvete !
Aí ninguém te chama não, não é ?
Eu fui até lá atender o chamado, esperando que já
seria para fazer algo que aquele povo raquítico e
baixinho que me chamava era simplesmente
incapaz de executar.
Carregar algum tronco de árvore pesado por
exemplo, sei lá !
Mas finalmente eu cheguei até la e perguntei pra que é que me chamaram, mas o pai e o garoto não quiseram me contar.
__ Vem aqui um pouquinho moço. Rápido !
Rápido!
Quando eu entrei uns passos pra dentro do quintal
eu ia distraído.
E tinha um tumulto ali perto do portão do lado de
dentro da cerca.
Tava a esposa do caseiro, a filha adolescente dele,
uma vizinha, mais duas crianças ou três, todos ali
ao redor.
Eu nem entendi pra que precisavam de mim se
tinha tanta gente ali em volta.
Era uma verdadeira multidão !
E ainda tinham ido me chamar ?
A esposa do caseiro tava nervosa !
A filha mocinha, nervosa !
Uma mulher desconhecida tava vermelha, com os
olhos marejados de choro.
E foi só então que eu comecei a entender o sufoco que estava acontecendo , percebi que uma criancinha de menos de três anos estava ali agachada e chorava ao lado de uma bicicleta grande e vermelha.
Não lembro a marca, pode ter sido de uma monark.
Que importa ?
A criancinha tinha conseguido quase que por um
milagre, enfiar a ponta de um de seus dedinhos
curiosos e intrometidos.
DENTRO DA COROA DENTADA NA
CORRENTE DAQUELA BICICLETA !
E chorava ! É claro ! Tava doendo com toda a
certeza !
Tava bem na metade da coroa ! Bem travado e no
centro !
Mas o que aquele bando de patetas estava fazendo
ali que não viu isso em ?
A ponta do dedinho da criança já estava ficando
roxinho !
E quando eu olhei vi que tinha uma marquinha de
sangue naquele dedo indicador gordinho...
Não faltou quem tivesse a ideia idiota de tentar
andar para frente ou para trás a coroa para que
rodasse e tirasse o dedinho da criança.
Mas só de tocar naquele pedal já apertava ainda
mais o dedinho e a criança chorou ainda mais alto !
__ Não! Num pode mexer no pedal senão a
corrente aperta mais e vai cortar o dedinho da
criança fora !
__ Ai Meu Deus Do Céu ! E Agora ?
A mãe só sabia gritar e chorar. E a vizinha, mulher
do caseiro também !
Aliás todo mundo gritando né...
Calma! Vamos tirar o dedinho da criança daí, mas
não dá para ser do jeito que entrou !
Todo mundo me apertando pra ter pressa e tirar
logo a criança, mas o dedinho estava meio que em
uma zona de conforto.
Tava apertando mas não tava esmagando, e
enquanto a gente não puxasse nem empurrasse o
dedinho da menininha estava garantido.
Foi num relance que me veio a ideia salvadora !
O senhor tem aí uma chave de boca ?
Chave de boca ? Todo mundo se entreolhava um
para a cara do outro com aquelas caras de patetas
como se eu tivesse pedido alguma coisa do outro
mundo.
Uma bandeja de besouros, ou uma sereia de
biquíni, sei lá.
Ninguém ali tinha a menor ideia do que seria uma
chave de boca?
É aquela chave de tirar a roda da bicicleta !
Como é que vocês fazem pra tirar a roda da
bicicleta ? Ou então se tiver um alicate...
__ Eu sei onde tá as chaves pai !
__ Ei, então vai lá buscar ou traz um alicate se
você tiver !
Esses adolescentes de treze anos as vezes não são
tão inúteis quanto eles parecem não é ?
O garoto correu lá na casa e voltou com as chaves
que pedi.
Por sorte era a chave certa.
Eu então escolhi a chave que caberia na porca da
roda de trás da bicicleta.
Do lado da rodinha dentada da catraca.
Essa é a grande vantagem das modernas bicicletas
de marcha.
É muito fácil de afrouxar a corrente e jamais irá
prender o dedo de alguém de forma a ficar
grudado.
prender o dedo de alguém de forma a ficar
grudado.
Foi só eu afrouxar aquela porca da roda e o eixo
traseiro ficou livre.
Eu mal empurrei a roda para a frente e a criança
tirou o seu dedinho maltratado daquela situação
que ela mesma se colocara.
Ficou só um cortinho e estava meio amassado de
ter se apertado ali tanto tempo e sem circulação.
Ficou um pouco roxinho e devia estar bem
dolorido.
Mas estava salvo. Logo tudo não teria passado de
um susto!
A mãe agradeceu tanto que só faltou me beijar, e
todo mundo me elogiava por ter ajudado.
Mas eu nem fiz nada, apenas afrouxei uma
porcaria de uma porquinha.
Foi a sorte eles terem a chave e ter também a
alicate.
Mas a grande sorte mesmo, a sorte maior foi não
tentarem rodar na marra a corrente pra tirar.
Teriam amputado o dedinho da bebê.
Daí seria tarde para me chamarem e naquele quase
início de década de 90 duvido que alguém poderia
reimplantar dedo como se faz atualmente em
alguns lugares.
Vendo que agora tudo estava calmo e o problema
estava resolvido.
Voltei lá para a minha tarefa inglória de espetar as
mãos plantando o meu abacaxi, meu primo tinha
ficado lá plantando e eu cheguei já tinha até quase
acabado as mudas que tinha.
Ainda me bailava na ideia uma pergunta. O que
faziam as mães daquelas crianças que não viram
que a pequenininha estava fuçando logo ali naquela coroa da bicicleta?
Agora já de volta quando me perguntaram o que
tinha acontecido, eu falei a verdade: __ Uma
criança tinha prendido o dedo na coroa da
bicicleta. Eu afrouxei a roda e o dedo saiu...
tinha acontecido, eu falei a verdade: __ Uma
criança tinha prendido o dedo na coroa da
bicicleta. Eu afrouxei a roda e o dedo saiu...
Isso foi tudo .